segunda-feira, 5 de setembro de 2011

O barbudo

Ele nunca deu sorte. 

Tenho um companheiro de longa data que volta e meia se dispõe a fazer companhia em incursões pelos jardins paulistanos atrás de tradicionais maluquices vistas em quadra em jogos do Paulista ou NBB. Gosta do jogo, mas não o segue como religião. No caminho, faz questão de perguntar quem seriam os nomes interessantes para se ficar de olho. 

Quando arranjamos nosso lugar nos quase sempre vazios ginásios, ele usa o aquecimento para conferir quem era quem dos nomes comentados no trajeto e se familiarizar.

Há um caso de um jogador que obviamente o deixou desconfiado e inquieto na arquibancada, embora e segurasse para questionar se era aquele mesmo a ser observado  – afinal, sabe tudo de tênis, é letrado em futebol, voltou este ano ao fantasy, mas, na questão do bola ao cesto, o sabidão, na teoria, era o outro. Ele já o viu em ação ao menos em duas partidas ao vivo, e nunca pegou o em um dia bom. 

Estamos falando de Vitor Benite, seja em ação pelo Franca em um confronto com o Pinheiros pelos playoffs do Paulista 2010 ou pela Seleção em amistoso contra o amador México no clube Hebraica, antes da viagem para a Argentina neste ano. Nas duas ocasiões, o atleta, de 21 anos, pouco fez em quadra. De certo modo, forçou arremessos de longa distância, parecia muitas vezes passivo no ataque, sem se achar em quadra, basicamente. Em nada parecia o jogador que fez um excelente NBB, com média de 14,7 pontos por jogo e aproveitamento de 56,25% nos dois pontos e 40,65% nos três pontos. 

Contra os mexicanos, procurei me pronunciar prontamente: "É, ele não está muito bem hoje de novo, não". O companheiro ficou aliviado, achando que talvez estivesse perdendo algum detalhe importante, algo intangível naquele barbudo. 

Argumentei que aquele não era o padrão do garoto. Que geralmente ele se mostrava como um jogador impetuoso, à vontade em quadra, independentemente das circunstâncias que o cercam. Afinal, foi a esse jogador que fui apresentado num duelo entre Rio Claro e Paulistano em 2008, em que o então juvenil carregou um time de veteranos como Danilo, Estevam, Diego, dirigido pelo argentino Carlos Romano e à beira da extinção pela Ulbra,  salários atrasados à parte, em um confronto duríssimo com o time da capital, claramente o favorito.

Aquele Benite era uma figura agressiva, em constante movimento pela quadra, que não se contentava com as brechas de longa distância, que procurava ir à linha de lances livres, que causava um problema danado para o técnico João Marcelo Leite. Era o dono da bola. 

Sua passagem pelo Pinheiros acabou não sendo das melhores e, em Franca, ele se adequou ao elenco mais volumoso e, em seu segundo ano de casa, acabou desabrochando. 

Na Seleção, atuando exclusivamente como ala e suplente de Alex, Benite demorou um pouco para engrenar. Nem mesmo durante a fanfarra da Copa Tuto Marchand conseguiu se destacar. Estava correndo o risco de deixar a rotação de Ruben Magnano para valer, reduzindo de modo ainda mais drástico a rotação do argentino. Até que veio a pelada contra Cuba. Em um jogo de tantos pontos negativos, ao menos conseguiu desencantar, carregando essa boa forma para o duelo com os uruguaios, em que foi o cestinha com 21 pontos, aproveitando oito de seus dez arremessos (cinco em sete de três pontos). Seu aproveitamento nos últimos dois jogos foi de 71,4% nos arremessos de quadra, um rendimento incrível, para oferecer a Magnano mais uma alternativa ofensiva, assim como  Romero o empregava confortavelmente três anos atrás, em um nível de competição bem inferior, claro, com menos pressão, mas tudo isso valendo para um jovem de18 anos também. 

O desafio para Benite agora é saber dosar toda sua energia no ataque e apoiar Huertas na condução da equipe, em vez de ser uma mera válvula de escape nos tiros de fora  – a aplicação na defesa certamente é o que impediu o técnico da Seleção de tirá-lo de quadra por completo e deve ser mantida. Afinal, esse é o mesmo Vitor Benite que rompeu com Franca de modo surpreendente para assinar com o Limeira, de Demétrius (assistente técnico em Mar del Plata, num mundo muito pequeno), com a promessa de que lá ele poderá ser novamente o dono da bola (e aqui resta saber o que Eric Tatu tem a dizer a respeito). 

No estado sofrível em que se encontrava o ataque da Seleção, qualquer ajuda, contudo, era e continua bem-vinda. 

Uma pena, porém, que aquele mesmo companheiro, dos bancos nem sempre confortáveis dos clubes mais requintados do esporte paulistano, não esteja pelas bandas para conferir – está a trabalho na Itália. Provavelmente vai ler esse post e não entender nada. 

É aquele mesmo?

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